CARTA PASTORAL SOBRE PRÁTICAS CHAMADAS NEOPURITANAS QUE TÊM ABALADO A SAÚDE E UNIDADE DA IPB

NOTA: A Comissão Permanente Para Elaboração de Carta Pastoral Referente a Práticas Neopuritanas elaborou três documentos que foram aprovados pelo Supremo Concílio da IPB: “…1) Um Relatório Extenso, de natureza acadêmica-teológica que sirva de subsidio para aprofundamentos na matéria; 2) A Carta Pastoral determinada pela resolução que estabeleceu a Comissão, para instrução geral e prática da Igreja; e 3) Um Sumário Executivo que resuma a análise resultante do trabalho da Comissão, primariamente para referência e uso conciliar..”. O que segue é a transcrição da Carta Pastoral redigida pela Comissão. Para acessar a composição integral do trabalho da Comissão acesse: https://se.icalvinus.app/documentos/doc0005027.pdf
“Portanto, assim como em tudo abundais em fé, e em palavra, e em saber, e em toda a diligência, e na vossa caridade para conosco, assim também abundeis nessa graça” 2 Coríntios 8:7
Prezados Irmãos, Graça e Paz!
A “Comissão Permanente para examinar a possível extensão do dano que a prática dessas igrejas tem causado nas igrejas presbiterianas, redigindo Carta Pastoral para orientação da IPB quanto às práticas neopuritanas que tem abalado a saúde e unidade da igreja”, criada pelo Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil em sua XXXIX Reunião Ordinária (2018) e composta dos seguintes membros devidamente empossados, reverendos Davi Charles Gomes (relator), Francisco Macena (sub-relator), José Alex Barreto, Saulo de Carvalho, Alexandre Ribeiro Lessa, Samuel Bezerra Ribeiro, e presbíteros Cláudio Silva da Cruz, César Miranda dos Santos, João Jaime Nunes Ferreira, Paschoal da Silva Filho, submete respeitosamente nesta o seu relatório final à XL RO — SC/IPB (2022).
CARTA PASTORAL SOBRE PRÁTICAS CHAMADAS NEOPURITANAS QUE TÊM ABALADO A SAÚDE E UNIDADE DA IPB
Introdução
O Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) tem recebido consultas e documentos de Presbitérios jurisdicionados referentes ao chamado movimento neopuritano e a certas práticas litúrgicas que têm provocado tensões e divisões em alguns campos da denominação.
Aprouve ao concílio maior tomar providências para a elaboração desta “Carta Pastoral quanto às práticas neopuritanas que têm abalado a saúde e unidade da IPB” (SC-2018-DOC. CV). [1] Aprovada pelo Supremo Concílio em sua Quadragésima Reunião Ordinária, esta Carta fornece esclarecimento e orientação para os concílios, ministros e membros jurisdicionados à Igreja Presbiteriana do Brasil visando à preservação da unidade cristã da denominação e à preservação de sua identidade confessional sadia. Na busca desse propósito, é também importante identificar a raiz histórica e teológica das tensões que se manifestam nos conflitos práticos quanto ao culto e outras questões da vida ordinária da igreja.
Como Carta Pastoral para toda a IPB, é preciso esclarecer, logo no princípio, que a extensão do problema dentro da IPB não deve ser superestimada. As dificuldades com o chamado neopuritanismo são reais, porém estão longe de terem abalado a saúde e a unidade da IPB de forma mais geral ou ampla. Tais problemas são primariamente localizados, em parte regionalmente, e por vezes, impulsionados pelas mídias e por outros fatores que podem fazê-los parecer maiores que sua real dimensão. A clareza quanto ao real tamanho das dificuldades mostrará que, na maioria dos casos, disciplina equilibrada, orientação e paciente amor cristão são os remédios suficientes e eficazes.
Para essa clareza, entretanto, é importante entender um pouco da história das origens puritanas da confessionalidade presbiteriana. Isso inclui reconhecer suas tensões históricas. Também demanda reflexão sobre a natureza do compromisso requerido aos ministros e oficiais da IPB em relação às Sagradas Escrituras e aos chamados “padrões subordinados” (os Símbolos de Fé adotados pela IPB desde 1888: A Confissão de Fé de Westminster e seus Catecismos Maior e Menor). Esse conhecimento tornará possível a orientação positiva que aponta para caminhos de paz e consenso, mesmo em meio às possíveis diferenças, e esse é o alvo desta Carta Pastoral.
Raízes da tradição Presbiteriana no Puritanismo histórico
O Puritanismo foi um movimento de reforma da Igreja da Inglaterra, o qual teve seu desenvolvimento histórico mais marcante entre 1564 e 1662. O termo puritanismo foi cunhado na época (inicialmente com intuito pejorativo) para identificar um movimento na direção da reforma calvinista e contrário à submissão ao catolicismo romano e à insuficiente reforma promovida pelo anglicanismo. O puritanismo histórico não deveria ser identificado como um movimento religioso necessariamente extremista, ainda que seja possível identificar posicionamentos censuráveis de radicalismo entre algumas das personagens do movimento. O movimento passou por momentos de franco apoio institucional da monarquia (como no reinado de Eduardo VI), por momentos de intensa perseguição pelo pró-catolicismo (como no reinado de Maria Tudor, a “sanguinária”) e por momentos de imposição de soluções e arranjos políticos ecléticos cuja real motivação era manter a Inglaterra unida (como no reinado de Elizabeth).
Muitos puritanos perderam suas vidas defendendo o direito a uma forma de culto mais alinhada com as Escrituras Sagradas. Outros deixaram a Inglaterra com a intenção de fundar uma igreja mais pura no “Novo Mundo” (América do Norte). Esse engajamento e disposição para a ação, para o exílio e até para o martírio é ainda hoje objeto de grande admiração e inspiração para muitos que anseiam uma experiência de piedade mais profunda com o Senhor.
Engana-se, no entanto, quem pensar que o movimento era completamente coeso, mesmo em sua raiz histórica. Existiam vários lados, com graus variados de afinidade e de divergência entre eles, tendo como ponto em comum basicamente a piedade fervorosa e o interesse reformista, especialmente nas relações com o Estado em termos de religião. Algumas de suas lutas pareceriam estranhas hoje, pois diziam respeito à resistência aos pontos específicos do culto que eram tidos por resquício das distorções do catolicismo romano (por exemplo, demanda pelo fim da obrigatoriedade das vestes clericais, do sinal da cruz no batismo, do curvar-se ao nome de Jesus, do uso de alianças na cerimônia de casamento e do uso da palavra sacerdote no Livro de Oração, como se vê no documento chamado Petição Milenar, de 1604). Havia também um antagonismo entre separatistas (que criam ser preciso criar igrejas independentes da Igreja Anglicana) e não-separatistas. Os episcopais, presbiterianos e congregacionais tinham visões distintas da forma de administração da igreja. Até o fato de que alguns puritanos decidiram emigrar para a América do Norte era controverso, pois para outros puritanos eles seriam desertores da luta pelo avanço da reforma da Inglaterra.
Durante o reinado de Carlos I (1625–1649), as tensões religiosas culminaram com uma crise política que ameaçava a governabilidade e que precipitou a guerra civil na Inglaterra. Aconteceu um gradativo enfraquecimento do monarca e ao mesmo tempo um fortalecimento do Parlamento. Isto criou as condições necessárias para a convocação da Assembleia de Westminster, com o propósito de alcançar uma expressão unificada da religião que fosse assegurar a união dos três reinos (Inglaterra, Escócia e Irlanda). Essa assembleia produziu uma Confissão de Fé e dois Catecismos (Maior e Menor) que possuíam um caráter internacional e de consenso, evitando pontos inovadores ou controversos para a comunidade reformada da época.
Ainda assim, muitas chamas de controvérsia permaneceram acesas entre os cristãos reformados na Inglaterra. Por exemplo, não houve consenso com respeito à forma de governo eclesiástico e os reformados acabaram por se dividir entre episcopais, congregacionais e presbiterianos, como mencionado acima. As divergências escatológicas também regaram imensamente as discussões sobre as relações com o Estado e a possibilidade de reforma social abrangente, chegando, em alguns casos, à expectativa de restauração iminente de um “paraíso na terra” ou de um reino milenar estabelecido pela igreja. Havia ainda no movimento tensões quanto à natureza da subscrição requerida aos padrões de Westminster e em relação ao papel e função dos Credos históricos da Igreja. O enfraquecimento do movimento puritano se deu na proporção da ampliação de suas divisões internas a partir do reinado de Carlos II. Apesar disso, muito do legado puritano é de extrema utilidade para o povo de Deus hoje e deve continuar a ser estudado à luz das Escrituras.
Não resta dúvida, porém, de que do legado do puritanismo histórico, os Símbolos de Fé de Westminster (também chamados de padrões subordinados, no sentido de que derivam sua autoridade do padrão final de fé que é somente a Sagrada Escritura) são uma das dádivas mais preciosas. Seu valor histórico e prático na afirmação de um entendimento reformado das Escrituras Sagradas fez com que servisse de referência não apenas para reformados e presbiterianos da época de sua elaboração, mas mesmo nos séculos que seguiram. A Confissão de Fé de Westminster foi adotada quase que integralmente pelos presbiterianos das colônias da América do Norte (1729) e pelo primeiro Sínodo da Igreja Presbiteriana do Brasil (1888). Ainda é hoje um dos conjuntos mais importantes de confissão reformada e a base teológica de subscrição para a maioria dos presbiterianos ao redor do globo.
Os Padrões de Westminster e a herança confessional da IPB
A Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) adota oficialmente como Símbolos de Fé a Confissão de Fé de Westminster e seus dois catecismos, na companhia da maioria dos presbiterianos no mundo. A fidelidade às Escrituras, aos Símbolos de Fé e à Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil é reconhecida por irmãos de outras denominações reformadas como fator que tem protegido a IPB da degeneração do liberalismo teológico (um movimento variado em expressões, mas que essencialmente concede preponderância à autonomia da razão humana ou da experiência religiosa humana sobre a revelação proposicional nas Escrituras Sagradas). Foi assim que, diante do desafio de propostas alinhadas com liberalismo, pluralismo, carismatismo e neopentecostalismo, por exemplo, a IPB se manteve oficialmente firme, rechaçando o afrouxamento confessional, mesmo que essas e outras batalhas ainda sejam travadas na IPB.
É preciso, todavia, entender o que significa adotar os Símbolos de Fé, ou seja, o significado daquilo que é chamado de subscrição confessional. A identidade confessional da Igreja Presbiteriana do Brasil não deve ser considerada à parte do espírito das igrejas presbiterianas da América do Norte, as quais supervisionaram a obra missionária neste país. Além da pregação do Evangelho, os pioneiros trouxeram para o Brasil uma rica e sólida herança confessional, constantemente testada e temperada pelo equilíbrio entre o Sola Scriptura, a autoridade do padrão subordinado e os limites claros para a liberdade de consciência.
Saber a história do Ato de Adoção de 1729, quando a igreja presbiteriana se organizou ao redor dos padrões de Westminster na América do Norte, ajuda a entender a identidade confessional da IPB. Isso é especialmente importante nos dias atuais, quando se começa a debater com maior propriedade, ainda que timidamente, o significado do compromisso dos oficiais e ministros da IPB com os padrões subordinados de Westminster. É perceptível como as relações entre pastores docentes e regentes podem ser duramente fraturadas quando os pressupostos da subscrição confessional são sustentados com extremismos, quer seja em uma visão extremada do significado da recepção literalista dos padrões subordinados, quer seja uma atitude de completa alienação dos Símbolos de Fé e sua importância para a formação espiritual do povo de Deus.
Alguns debates que afloram em certos ambientes da IPB não deixam de refletir os debates que surgem de forma pendular na América, desde 1729. Aqui é importante especificar um pouco mais o que foi dito acima. A Igreja Presbiteriana do Brasil já enfrentou lutas históricas e foi preservada pela graça de Deus. Contudo, nos anos mais recentes, os debates sobre a subscrição ganharam um novo impulso com as tentativas de equiparar ou reduzir a subscrição confessional à adesão uniforme de aspectos da teologia do culto como a salmodia exclusiva, o silêncio absoluto das mulheres no culto público e a remoção permanente de corais, instrumentos musicais e grupos de música. [2] Nem todos que defendem tais práticas estão dispostos a fazer delas um teste para a identidade presbiteriana, mas alguns movimentos que promovem a tradição puritana no Brasil parecem afirmar que o compromisso confessional só se manifesta dentro dessas balizas litúrgicas mais rígidas. Os excessos, porém, não surgem apenas da parte dos mais rigorosos, mas também dos mais “abertos” que exageram o “perigo neopuritano” como pretexto para enfraquecer a confessionalidade saudável e em seu lugar promover uma abertura teológica e pragmática incompatível com a identidade presbiteriana histórica.
A formação do Sínodo Presbiteriano da América (1729) já envolveu de começo a necessidade de conjugar várias tendências. Nos êxodos puritanos do século XVII milhares de congregacionais e presbiterianos emigraram para as colônias da Nova Inglaterra no afã de se verem livres da perseguição. Mesmo nas igrejas congregacionais havia respeito às contribuições válidas que os Sínodos e o corpo de presbíteros trariam como auxílio para as congregações — eram irmãos que estavam satisfeitos com a substância do calvinismo contido na Confissão de Westminster embora manifestassem escrúpulos sobre a disciplina da Igreja. Neste espírito, presbiterianos e congregacionais procuraram formas de coexistência pacífica e, em alguns casos, buscavam caminhar unidos.
Ainda em 1690, colonos escoceses fundaram igrejas presbiterianas nas Carolinas, mas essas eram igrejas caracterizadas por uma prática litúrgica bem restrita, especialmente o uso exclusivo de Salmos Bíblicos literais para o canto congregacional (eram Covenanters). Na Virginia e em Maryland, entre 1680 e 1690, colonos escoceses-irlandeses viram o trabalho presbiteriano crescer por meio dos esforços de Francis Makemie, um homem próspero e liberal que usou seus recursos em prol da obra de Cristo. Com o passar do tempo o trabalho presbiteriano frutificou e em 1706, reuniu-se o primeiro “presbitério da América do Norte”, contando com sete pastores que concordaram em se reunir anualmente para tratar de medidas apropriadas ao crescimento da obra, exame de candidatos, bem como a cooperação com congregacionais e trabalhos presbiterianos nascentes em outras regiões. [3] A semente que fora plantada vingou e estava em franco crescimento.
Um outro grupo distinto de presbiterianos coloniais precisa ser destacado, pois sua história trazia marcas específicas que afetariam a formação do sínodo. Muitos imigrantes Irlandeses chegaram às colônias fugidos da seca que se abateu sobre Ulster entre 1717–1718. Além da fé presbiteriana, aqueles que vieram de Ulster trouxeram as feridas de suas guerras confessionais e, consequentemente, os temores quanto às tensões sobre quão estrita deveria ser a subscrição confessional. [4]
Com este pano fundo, em 1729 o Sínodo presbiteriano da América foi organizado, mas com ânimos divididos. Já em 1721, casos envolvendo fornicação e falsos ensinos começaram a ser julgados nos presbitérios. Até aquele momento os padrões de Westminster não eram os documentos confessionais do presbiterianismo nascente. O debate se tornou mais relevante depois que os casos de pecado entre ministros requereram julgamentos firmes.
Dois personagens foram altamente proeminentes nesse período e suas posições moldariam a confessionalidade daqueles presbiterianos de uma forma tão marcante que nos dias de hoje, em tese, se discute o mesmo ponto de 1729. [5] O defensor da subscrição total aos padrões de Westminster foi o pastor John Thompson. Em 1727, ele liderou um movimento para que os outros presbitérios debatessem de forma sinodal a recepção da Confissão de Westminster para estabelecer uma confissão de fé verdadeira entre os ministros presbiterianos. Em contraposição a Thompson, o destacado pastor Jonathan Dickinson, egresso do congregacionalismo, se filiou, juntamente com sua igreja ao Presbitério da Filadélfia em 1717”. [6] A posição de Dickinson era que um credo humano vinculante além de enfraquecer a autoridade suprema das Escrituras, ainda levaria os presbitérios para o vórtice das divisões e conflitos. Ele defendia que um acordo em torno daquilo que era “essencial e necessário do cristianismo, bem como os métodos de adoração e disciplina” já era suficiente para unidade dos ministros. Estas duas correntes sobre a subscrição confessional, ainda que com algumas variações, concorreram para a reunião do Sínodo colonial presbiteriano em 1729 e alguns pensadores sugerem essa tensão como suficiente para se entender o Ato de Adoção em 1729.
Mais importante, porém, que reconhecer as tensões presentes, é conhecer a maneira como elas foram resolvidas. Talvez uma forma mais frutífera de se entender a resolução das tensões (e mais útil para nossa situação na IPB) seja a proposta de Donald S. Fortson III. Falando da tensão original desde 1729 e de momentos subsequentes nos quais o presbiterianismo norte americano precisou buscar a resolução de tensões latentes, ele sugere que os planos de união entre as partes fraturadas do presbiterianismo americano recuperavam o espírito original do Ato de Adoção de 1729 na medida em que “o resultado louvável das discussões francas foi a conquista de um notável consenso sobre a subscrição confessional”. [7]
Quando cada lado reconheceu seus erros e acertos e, acima tudo, quando eles passaram a olhar para uma unidade robusta com espaço para diversidade em pontos menores, o presbiterianismo prosperou. Uma posição equilibrada que admite a subscrição integral com espaços para a qualificação em questões menos essenciais era o melhor consenso possível na relação direta entre Bíblia e Tradição. O Ato de Adoção seria assim um excelente exemplo de equilíbrio fino, o qual pode ser muito importante para os atuais e futuros debates sobre subscrição na IPB. Os extremos foram postos de lado em prol do melhor consenso possível dentro das balizas bíblicas e reformadas. O resultado foi o estabelecimento de um princípio de subscrição integral ponderada e uma tradição de buscar o melhor consenso possível para a preservação da fidelidade confessional e da paz fraterna.
As mesmas forças presentes no Ato de Adoção de 1729 parecem ter permeado outras tensões posteriores no presbiterianismo norte americano. Embora possa parecer desnecessário, na verdade, guardadas as devidas proporções, há utilidade prática hoje em indicar as velhas lutas em torno da subscrição confessional dentro das principais divisões subsequentes do presbiterianismo americano, a saber: O Velho Lado versus Novo Lado e a Velha Escola versus a Nova Escola. Em todos esses debates havia extremistas e moderados. O caminho do melhor consenso possível não resolveu todos os conflitos, mas de tempos em tempos ele oxigenou o presbiterianismo com uma unidade robusta, franca e possível de ser realizada com fidelidade, a despeito de diferenças em questões menores, quando essas, de fato, são tratadas como questões menores e a ortodoxia, de fato, é realmente tratada como ortodoxia. Uma vez firmados os termos, cada parte deve se comprometer em renovar os votos de ordenação tanto naquilo que diz respeito a subscrição dos padrões subordinados quanto na busca pela paz entre os irmãos.
Talvez mais conhecida dos leitores brasileiros, a divisão entre a Velha Escola e Nova Escola deve ser brevemente destacada aqui, especialmente porque ela paira proximamente no pano de fundo do estabelecimento do presbiterianismo brasileiro. A divisão de entendimento entre essas escolas não se devia a um fator, mas a vários fatores, dentre eles a evangelização nas fronteiras americanas, a questão dos escravos e os métodos usados pelos avivalistas. Os homens mais rigorosos bem como os mais moderados da Velha Escola começaram a fazer vários questionamentos acerca das práticas e dos acordos dos pastores da Nova Escola. Pesava para eles a incerteza sobre a fidelidade de um ministro congregacional aos votos de ordenação e os exageros dos avivalistas. A preocupação dos homens da Velha Escola era que a confessionalidade fosse diluída por meio desses acordos ousados em termos ecumênicos. A igreja poderia facilmente se tornar refém de modismos teológicos. Alguns presbiterianos do Novo Lado achacavam a autoridade da Confissão com jogos de palavras sugerindo que “nenhuma luz fica visível quando o sol surge”. Com isso eles queriam dizer que a Confissão desaparecia diante da luz da autoridade das Escrituras. Por outro lado, os homens da Velha Escola, dentre eles Charles Hodge, questionavam que valor tinha um juramento confessional “proforma”, ou seja, por mera formalidade e sem nenhum vínculo de consciência.
Mais uma vez a ferida da desunião manchava o testemunho daqueles cristãos. Contudo, graciosamente, o Senhor deu os meios para que eles pudessem, novamente, juntos buscar o melhor consenso possível em torno da Palavra e da modalidade de subscrição confessional. Recontar essa história implica em registrar como aqueles irmãos do passado foram verdadeiros gigantes capazes de reconhecer que mesmo os defensores da Velha Escola eram falhos na exposição das doutrinas da graça, quase como que adormecendo os ouvintes em vez de confrontando pecadores. Por outro lado, a Nova Escola também foi responsabilizada pela divisão, especialmente na maneira como eles foram excessivamente tolerantes deixando passar teologias de cunho pelagiano como se fosse algo simples. Com as cartas colocadas sobre a mesa, aqueles pais presbiterianos partiram para uma nova tentativa de união,sabendo que a uniformidade perfeita não era o ponto, mas a declaração conjunta em torno das doutrinas fundamentais das Escrituras tal como expõe a Confissão de Fé e seus Catecismos. Em 1864, os presbiterianos do Sul se reuniram — sob a liderança de Dabney, um dos campeões da Velha Escola — em busca um acordo fraterno que se fortaleceu e ganhou simpatia. Dabney disse na época:
Afirmo que, ao encontrar nossos irmãos da Nova Escola para o propósito que vocês nos enviaram, uma generosa linguagem de concessão foi a mais apropriada. Reunimo-nos, não para dividir as várias medidas de culpa sobre os responsáveis, nem para nos vingarmos, mas para reconciliar, curar, e colocar essa velha culpa e suas amargas consequências no caminho do esquecimento pleno. Os homens que se encontram para tal propósito, se forem sinceros, acharão muito mais apropriado assumir uma parte generosa da culpa das antigas divisões, do que preocupar-se em carimbar a culpa dos antigos oponentes, que agora professam perdoar. (Fortson, 2008, posição 5806)
Assim, nem a subscrição idealizada pelos mais rigorosos e nem a frouxidão confessional triunfaram quando os presbiterianos do Sul se reuniram em busca do melhor consenso possível. Por mais um tempo os presbiterianos tiveram a sabedoria do alto para lutar pela fé reformada sem abrir mão da paz entre os irmãos a despeito de pensarem diferente em muitos outros assuntos.
Práticas neopuritanas e a identidade confessional da IPB
O recente aumento do interesse mundial pela tradição reformada, algo extremamente positivo, não deixa de ter sido acompanhado por um aumento de manifestações extremistas. Sem dúvida, o que move muitos dos irmãos com tendências mais extremas é o desejo de uma experiência cristã mais pura, porém alguns dos seus ideais não são essenciais à reforma, como são essenciais os Cinco Solas da Reforma e os padrões subordinados oficialmente recebidos pela IPB em 1888. Ideias e práticas tais como salmodia exclusiva, canto somente à capela, obrigação feminina de cobertura da cabeça com o véu, a abstenção do voto e de vida política dentro do Estado democrático de direito, e de expectação de uma nova ordem mundial com a restauração da lei civil mosaica são alguns exemplos que não se alinham à essência da Reforma. Embora elas possam ter o seu valor para piedade daqueles que assim o preferem, precisamos reconhecer que, nos termos do apóstolo Paulo em Romanos 14 e 15, não tornam ninguém mais ou menos digno.
Aprouve ao Senhor uma atual redescoberta do pensamento calvinista e um interesse internacional e amplo pela contribuição puritana, especialmente as expressões saudáveis do calvinismo experiencial. [8] Ao mesmo tempo em que isto é celebrado, deve haver uma inquietação com os desafios e lutas que atualmente muitas denominações reformadas enfrentam na busca da preservação de sua unidade interna.
Quanto à Igreja Presbiteriana do Brasil, suas resoluções antigas e recentes demonstram uma posição geral de compromisso com a ortodoxia cristã e reformada, mas isso não ocorre sem esforços ou tensões. Quando chamada para se posicionar oficialmente ante os desafios, a denominação tem sido consistente na recusa de alinhamentos com o liberalismo, com as seitas neopentecostais, bem como com quaisquer afrouxamentos confessionais ante pensamentos pluralistas, pragmáticos, carismáticos e neopentecostais. Vale notar também que no atual momento (pelo impacto de mídias eletrônicas que fazem chegar aos lares grande volume de pregações e material reformado, impulsionadas tanto por esforços nacionais quanto internacionais) muitos evangélicos têm procurado conhecer as igrejas reformadas do país e, em muitos casos, famílias inteiras, egressas de movimentos que tolhiam a exposição bíblica, procuram as igrejas presbiterianas.
É importante, contudo, não ignorar os desafios. Nos últimos anos, junto com a recuperação da tradição reformada e puritana nos âmbitos global e nacional, têm surgido preocupantes condutas extremadas que anacronicamente se apoiam em expressões históricas periféricas do puritanismo, mais especificamente na ideologia histórica da uniformidade da religião nacional, tal como foi experimentado no passado presbiteriano escocês, ou mesmo no espírito de algumas denominações americanas que sofrem influências teonomistas e reconstrucionistas de raiz histórica puritana. [9]
Aqueles que se comprometem com aspectos peculiares da tradição reformada escocesa devem ser reconhecidos e amados como irmãos. São parceiros e cúmplices nas orações pelo bem da Igreja, bem como na manutenção integral da sã doutrina expressa pelos padrões de fé subordinados da Igreja Presbiteriana do Brasil. Não obstante, deve ser dito, em amor, que nas questões litúrgicas, políticas e missionais, a IPB se distingue de algumas das opiniões identificadas, por exemplo, com os Covenanters. Deve ser admitido que mesmo entre irmãos piedosos, fiéis e que subscrevem aos padrões de Westminster, há divergências no entendimento de práticas litúrgicas. Também não faz parte da tradição da IPB a defesa de um estabelecimento religioso do Estado ou de formas teonômicas da restauração da lei civil de Israel. Nem faz parte do legado da IPB a proibição de instrumentos musicais no culto ou do uso de corais, nem a exigência de cobertura da cabeça das mulheres. Embora essas posições tenham sido defendidas com maior ou menor uniformidade entre alguns puritanos, elas não representam a essência da identidade reformada, nem no sentido amplo de compromisso com as doutrinas da graça nem no sentido geral da comunhão global de igrejas reformadas na atualidade, e, especialmente, não no sentido estrito da fidelidade aos padrões subordinados de fé que essa denominação recebeu em 1888.
Na Igreja Presbiteriana do Brasil e no protestantismo brasileiro existem focos regionais de conflitos que, maximizados pelas mídias sociais, causam prejuízo e desavença em alguns presbitérios e sínodos da denominação por causa de apegos a pontos periféricos da tradição puritana que são radicalizados de forma excludente. Essa postura e muitas práticas por ela ensejadas são comumente chamadas de “neopuritanas”. Outrossim, é lamentável que o termo neopuritano tenha sido cunhado e esteja sendo usado de forma pejorativa, ambígua e indiscriminada no tempo presente. A consequência é a destruição de reputações, a perseguição ou o constrangimento de irmãos sinceros e piedosos, servos de Cristo, dentro da denominação — ironicamente uma atitude tão excludente quanto aquela dos que se consideram os únicos verdadeiramente reformados. O medo de ser identificado como neopuritano ou como simpatizante deles se torna algo real e alimenta sobremaneira o temor de homens no que se refere à vida conciliar e eclesiástica.
É fato que alguns reformadores magisteriais e puritanos mais radicais defenderam algumas das ideias e práticas hoje chamadas de neopuritanas. Tais ideias, porém, não são centrais à identidade reformada e nem ao legado dos puritanos em geral. Assim, a Igreja Presbiteriana do Brasil faz bem ao receber tais pontos como doutrinas indiferentes e, onde elas forem defendidas, que os seus aderentes o façam sem tratar tais pontos como uma quarta marca da igreja verdadeira. Os excessos impositivos devem ser tratados nos termos bíblicos, conciliares e disciplinares, especialmente no que tange ao não cerceamento da liberdade de consciência do crente. Igualmente, que os não adeptos fujam de acusações ou escárnio, pois tais atitudes causam a divisão nas igrejas. É mister lembrar que a liberdade de consciência do cristão quanto àquilo que transcende a Palavra e sua exposição nos padrões subordinados impede tanto a imposição de um neolegalismo quanto a injunção de um neoantinomismo. Deve haver acolhimento fraterno e transigência para com os que estão dispostos a defender tais pontos como indiferentes tanto para a salvação como para unidade externa da denominação. Contudo, deve-se resistir àqueles que em seu zelo desprezam como não reformados os que diferem nas adiáforas. Considerar tais assuntos como indiferentes não significa que sejam irrelevantes, significa sim que não haverá julgamento ou desprezo mútuo por causa desses assuntos — cremos ser essa a orientação de Paulo em Romanos 14 e 15.
Ao mesmo tempo, é crucial que os presbitérios velem pela integridade confessional em suas jurisdições, lembrando que os votos de ordenação também contemplam a busca da paz e da unidade no seio da igreja. O anseio é que todos procurem viver em comunhão de fé nas matérias essenciais dispostas nos padrões subordinados, tratando com a disciplina proporcional os oficiais e os membros que incorrem em práticas estranhas às Escrituras e aos fiéis símbolos de fé recebidos em 1888 — isso agrada ao Senhor da Igreja! Sejam quais forem as faltas, quer sejam liberais, fundamentalistas, neopentecostais ou manifestações do legalismo que se vale do puritanismo como plataforma de justiça própria, que estas sejam tratadas em amor visando a preservação e a restauração da comunhão dos santos. Assim como é danoso desprezar os irmãos que desejam cantar os salmos também é daninha a postura que incentiva o desprezo dos que tem uma posição diferente sobre o uso dos cânticos sagrados em nossas liturgias. Quando a atitude sectária está presente acontece o que disse João:
Escrevi alguma coisa à igreja; mas Diótrefes, que gosta de exercer a primazia entre eles, não nos dá acolhida. Por isso, se eu for aí, far-lhe-ei lembradas as obras que ele pratica, proferindo contra nós palavras maliciosas. E, não satisfeito com estas coisas, nem ele mesmo acolhe os irmãos, como impede os que querem recebê-los e os expulsa da igreja. (3Jo 9–10)
Não se deve ignorar que há em curso, muitas vezes, uma “guerra de palavras”. O uso de termos como “neopuritano”, “neopuritânicos” ou “neopresbiterianos”, às vezes, não se restringe à tentativa de distinguir manifestações do puritanismo saudável de suas formas extremista e sectárias. Há sempre a tentação de utilizar esses termos como rótulos que permitam desprezar aqueles de quem se discorda. Essa tentação deve ser evitada em favor de uma linguagem mais amorosa, saudável e responsável diante de Deus.
Ainda que o termo “neopuritano” já faça parte de resoluções oficiais, [10] o seu uso de forma ambígua e com caráter pejorativo certamente acarreta danos para a saúde e para a unidade da igreja que facilmente suplantam possíveis benefícios dessa nomenclatura. Os irmãos que em seu zelo e piedade têm posturas que diferem em rigidez de outros irmãos, em questões concernentes a práticas litúrgicas e outras coisas afins, precisam evitar tons ou falas condenatórias, ou mesmo certa altivez teológica, como se houvesse (ou fosse possível) uma unidade monolítica de práticas na tradição reformada bíblica e como se somente eles representassem os “verdadeiros reformados”. Havendo discordância entre líderes da IPB, que os irmãos se tratem com amor fraterno, sem o desejo de causar constrangimento ou de forçar o outro contra sua consciência diante de Deus. Que os membros da denominação saibam, no amor de Cristo, diferenciar aquilo que é saudável em sua herança puritana (muito do qual está hoje disponível na literatura brasileira e tem grande utilidade para fortalecer a visão confessional, contrapondo o pragmatismo ou o liberalismo), daquilo que é mera expressão de extremismo e de posturas que não fazem parte do puritanismo histórico ou principal.
As instituições que dirigem e executam as lides da Educação Teológica na Igreja Presbiteriana do Brasil, assim como os órgãos de imprensa e comunicação da IPB devem continuar se esmerando por trazer os melhores exemplos puritanos ao povo presbiteriano. A igreja deve continuar se beneficiando da rica tradição puritana que encontra sua mais bela expressão nos Símbolos de Fé da Igreja Presbiteriana do Brasil.
Desta forma, olhando firmemente para a expressão do Salmo 133, roguemos que a métrica da unidade e da piedade autêntica amparada na Palavra paute a melodia de nossas vidas diante de Deus, cantada para sua honra e glória. Cantemos em nossas igrejas:
Oh! Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos! É como o óleo precioso sobre a cabeça, o qual desce para a barba, a barba de Arão, e desce para a gola de suas vestes. É como o orvalho do Hermom, que desce sobre os montes de Sião. Ali, ordena o SENHOR a sua bênção e a vida para sempre.
Uma resolução das tensões que são geradas pelo conflito entre visões e práticas mais extremadas envolve a questão da natureza da subscrição confessional, como deve ser percebido do breve apanhado histórico acima. Em 2014, a Igreja Presbiteriana do Brasil explicou sua modalidade de subscrição confessional nos seguintes termos:
Considerando: 1) Que as definições apresentadas nos dicionários de língua portuguesa, apontam que as palavras lealdade e fidelidade são sinônimas, conforme abaixo: “O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa¹: lealdade s.f. (s XIII) 1 respeito aos princípios e regras que norteiam a honra e a probidade; 2 fidelidade aos compromissos assumidos; 3 caráter do que é inspirado por este respeito ou fidelidade […]. Fidelidade s.f. (s XIII) 1 característica do que é fiel, do que demonstra zelo, respeito por alguém ou algo; lealdade (f. ao rei) (f. religiosa)” ¹ DICIONÁRIO HOUAISS DA LÍNGUA PORTUGUESA. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 1163; 2) Que a CI/IPB e os Princípios de Liturgia não apresentam diferenciação entre tais termos; 3) Que para o cumprimento da lealdade aos Símbolos de Fé, se requer fidelidade, e esta reflete a obediência à Palavra de Deus; 4) Que o dever de lealdade, conjuntamente com o dever de respeito, é mais abrangente, de forma que traz o dever de fidelidade dentro de si e, consequentemente, não é possível ser leal sem ser fiel; O SC/IPB 2014 RESOLVE: 1. Quanto à pergunta “Há diferença nos termos lealdade e fidelidade, como alguns argumentam?”, responder que não há diferença; 2. Quanto à pergunta “O juramento de lealdade aos Símbolos de Fé adotados pela IPB, feito pelos oficiais, se refere a cada capítulo e ou seção, ao sistema geral, como um todo, tal qual apresentados por eles?”, responder que a reafirmação no momento da ordenação implica na aceitação integral, em todos os seus termos, dos Símbolos de Fé, conforme CI-IPB — Artigo 119, parágrafo único; 3. Quanto à pergunta “Qual é o exato significado da expressão “fiel exposição do sistema de doutrina” contido no juramento prestado por todos os oficiais presbiterianos no momento de sua ordenação?”, responder que o significado da expressão “fiel exposição do sistema de doutrina”, significa uma correta interpretação das Escrituras Sagradas, Antigo e Novo Testamento, com uma apresentação sistematizada. (SC — 2014 — DOC. XL)
A transcrição da resolução de 2014, possivelmente, revela mais que um mero esclarecimento semântico (referente ao significado das palavras) da língua portuguesa. A questão envolve todo o conteúdo histórico da distinção entre a chamada “subscrição de sistema” e a “subscrição integral”, mas de maior importância é o fato de que ela aponta para um sentimento da parte do concílio maior da IPB no sentido de ressaltar a importância dos votos de subscrição, indicando um anseio por uma subscrição autoconsciente por parte de seus oficiais. Ao mesmo tempo, o fato de, ainda em 2014, haver uma tentativa de esclarecimento dos termos indica que a denominação ainda percebe a necessidade de lançar luz sobre estes assuntos para refinar o voto de ordenação.
O esclarecimento sobre a subscrição confessional, diante dos debates anteriormente levantados no contexto colonial americano, faz necessário lidar com o seguinte trecho da resolução de 2014: “responder que a reafirmação no momento da ordenação implica na aceitação integral, em todos os seus termos, dos Símbolos de Fé”. Ainda que a resolução em tela traga luz para o assunto, ainda é preciso interpretar se os “termos” se referem a todas as partes da Confissão e se isso inclui todas as palavras da Confissão como se integral fosse sinônimo de literal. Um resgate das informações históricas sobre a recepção oficial dos Símbolos de Fé pelo sínodo geral da IPB em 1888, pela ótica dos registros mais próximos daquele período, especialmente na percepção das tendências Velha Escola (Old School) e Nova Escola (New School) pode auxiliar hoje na compreensão dessa tensão presente.
Ainda que a Igreja Presbiteriana do Brasil tenha sido implantada pelo trabalho missionário de duas juntas missionárias de igrejas presbiterianas distintas na América do Norte, o julgamento dos estudiosos daquele período identifica que as equipes missionárias pioneiras eram da Velha Escola. Isso indicava, do ponto de vista confessional, um compromisso com o sistema de doutrina da Confissão de uma forma mais estrita em comparação com os métodos da Nova Escola. Por isso, os ideais doutrinários e missionários mais conservadores permanecem fortes até o Sínodo de 1888. Não havia da parte daqueles missionários e dos pastores nativos algum tipo de anseio pela reforma dos padrões subordinados de Westminster. A Igreja Presbiteriana que nascia no Brasil era conservadora em sua doutrina, ou seja, era uma denominação calvinista em sua doutrina e presbiteriana em seu sistema de governo. Se havia divergências no período formativo, elas diziam respeito à prioridade da evangelização e ao papel de uma escola cristã, como focos que a filosofia de ministério do jovem Sínodo brasileiro teria de equilibrar. [11]
Em momento algum, os missionários pretendiam importar como fato decisivo na subscrição dos padrões subordinados assuntos como cântico de salmo exclusivo, remoção de instrumentos ou impedimento de mulheres orarem no culto público. Para aquele momento, pelo consenso das igrejas americanas, esses tópicos não deveriam ser transplantados para o Brasil, bem como outros elementos de ordem cultural. Ribeiro ajuda a compreender aquele momento:
A teologia de Princeton modelou a prédica, a polêmica e a ação pastoral dos introdutores presbiterianos da Reforma no Brasil. Ela ofereceu o modelo para a formação dos pastores nacionais e não esteve de todo ausente, na filosofia de educação subjacente, no primeiro grande conflito que enfrentamos. Falo da filosofia de educação subjacente de Nova Iorque, com a escola desvinculada da Igreja, em oposição à de Pereira. [12]
A prioridade dos pioneiros em focar na pregação do Evangelho e em implantar uma denominação calvinista e presbiteriana no Brasil pode também ser vista na história documental das Missões americanas. Sobre isso, Frank L. Arnold transcreve a resolução da Igreja do Sul em 1873:
Convém que não propaguemos nosso próprio corpo presbiteriano distintivo em diferentes partes do mundo, mas que disseminemos simplesmente os princípios e as doutrinas que confessamos… O missionário estrangeiro, com a benção de Deus, deve dar o impulso inicial da obra e, por certo tempo, planejar seu curso. Mas é para os homens que cresceram naquela terra o continuar e o expandir do trabalho. [13]
A decisão da Igreja do Sul revela outra faceta da identidade confessional da jovem igreja brasileira que se organizou no Sínodo de 1888, a saber: era impossível que ela já nascesse com um transplante de teorias de subscrição maduras. Os missionários de ambas as juntas — ainda que tivessem filosofias educacionais diferentes, no tocante à subscrição — optaram pela entrega simples do Evangelho e a transmissão das doutrinas confessionais, sem que isso fosse o reflexo de antigas batalhas entre Nova Escola e Velha, batalhas essas que eles lutavam para curar através de seus planos de união.
Para tornar mais claro o argumento, nota-se que no Brasil o assunto da salmodia exclusiva jamais foi um ponto chave para a missão. O assunto já havia sido alvo de sérios e graves debates nas igrejas americanas de tendência irlandesa-escocesa, “contudo, o conflito a respeito da música não transferiu para o Brasil porque o ‘Salmos e Hinos’ do Dr. Kalley dominou a Igreja Brasileira por mais de um século de missões”. Carl Joseph Hahn continua:
O próprio Diretório chegou ao Brasil através da Igreja Presbiteriana da América do Norte, onde já havia sofrido sérias alterações. Sofreu ainda outras modificações no Brasil, mas esta forma modificada ainda é o único Manual de Culto oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil. A pregação e a Palavra eram centrais e a simplicidade era a ordem do dia. [14]
Hahn se refere ao Manual de Culto da Igreja Presbiteriana do Brasil como o único documento oficial nessa questão, mas é fato que o antigo Livro de Ordem que antecedeu a presente constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil adaptava o Diretório de Culto ao contexto brasileiro de missão. Sobre isto, Ribeiro diz:
A Junta Missionária de Igreja do Norte (Nova Iorque) tem consciência do sucesso da sua nação, ao longo do período que estudamos. Aflora no patriotismo ianque a tese do Destino Manifesto, reservado pela Divina Providência à grande nação do Norte. […] O modelo de Nova Iorque pede o puro e simples transplante de suas instituições eclesiásticas nacionais ao “campo missionário”. Confissão de Fé e Catecismos, Livro de Ordem visam compatibilizar, em detalhes, as duas igrejas irmãs norte-americanas. [15]
O que deve ser apreendido dessa breve exploração da questão histórica da subscrição confessional nos primórdios da implantação e no começo do Sínodo brasileiro é o seguinte: a Igreja Presbiteriana do Brasil originalmente recebeu e adotou seus padrões subordinados de uma forma mais conservadora e alinhada com o modelo da Velha Escola, evitando tanto uma subscrição abstrata do sistema de doutrina calvinista quanto uma subscrição literalista, como pode ser visto pelo fato de que a forma adaptada do Diretório de Culto não implicava na proibição de salmos e hinos, bem como corais.
A repetição de algumas das tensões históricas do presbiterianismo norte americano não trará benefício à IPB hoje. A questão essencial da compreensão conjunta da subscrição confessional é de maior importância que os debates sobre práticas litúrgicas ou outras questões que nunca foram objeto de consenso na tradição puritana-presbiteriana. Alderi Matos, historiador oficial da IPB, lembra que a falta de lealdade e compromisso com a IPB é um problema atual de maior significado para a denominação: este problema “se manifesta de maneira crescente na despreocupação e indiferença para com os padrões doutrinários e litúrgicos da Igreja… [e que] nem sempre pastores têm sido fiéis aos seus votos de ordenação”. [16] A denominação que em 2014 se esforça por esclarecer sua forma de subscrição confessional dá assim sinal de que está em um ponto de sua maturidade denominacional no qual se faz mister e necessário tal esclarecimento, sem perder de vista o importante trabalho dos pioneiros que reuniram o melhor das Escolas do Norte e Sul da igreja americana para adaptá-los ao campo brasileiro.
O caminho do consenso equilibrado e da caridade
Tão importante quanto alcançar clareza quanto à compreensão compartilhada sobre a natureza da subscrição confessional na Igreja Presbiteriana do Brasil, entretanto, é entender como é que essa clareza foi alcançada historicamente em nossas origens no presbiterianismo norte americano e nos primórdios do presbiterianismo brasileiro. E foi exatamente o consenso equilibrado dos pioneiros da implantação e do Sínodo, refletindo o aprendizado de suas lutas internas, que fez a denominação nascer confessionalmente robusta e forte. Não sucumbir hoje a uma atitude de desprezo aos padrões subordinados e nem a uma postura de subscrição rígida como garantia suficiente de saúde institucional é continuar a busca por esse mesmo consenso equilibrado.
No passado, quando se perguntava sobre a identidade da Igreja Presbiteriana do Brasil se dizia que ela:
Tem liberdade sem extremos, caridade sem sentimentalismo, vagares sem desanimo, tolerância sem anarquia, e convicções sem orgulhos. Os princípios com que Calvino, embora todos os seus explicáveis defeitos, alindou o nosso sistema, mestre culto que foi intérprete piedoso e sincero da palavra eterna, são básicos e perduráveis — o reconhecimento enérgico e sistemático da soberania de Deus, sobre todas as coisas e pessoas; a doutrina irrecorrível da predestinação divina; a infalibidade da Palavra de Deus como padrão de vida e doutrina, a responsabilidade da criatura; a unidade espiritual de todos os crentes, como povo sacerdotal cristão, livre para organizar-se e viver de forma coletiva de Igreja Militante, visível, mas parte integral da Igreja triunfante remida, invisível, no passado, presente e futuro — esses princípios fazem do presbiterianismo uma chave áurea da fé evangélica e uma padrão forçado dos melhores sistemas teológicos. [17]
É mister que a denominação continue progredindo em seus debates confessionais, procurando refinar a subscrição seja por meio de esclarecimentos em pontos diversos ou melhorando a formação de seus oficiais para que o voto de ordenação seja mais autoconsciente e de coração. Como bem lembra Ulisses Horta,
Uma subscrição cem por cento rígida em termos de fidelidade, isto é, fidelidade às próprias palavras e sentenças, sobre um documento que já reconhece de saída sua falibilidade, é impossível. […] Por outro lado, uma subscrição que não se prenda ao todo do texto confessional, vale dizer a todas as doutrinas que expõe, e não apenas a um hipotético e indefinido “sistema” de doutrinas à parte dos símbolos, não tem razão de ser. [18]
Esse é o grande desafio que esta carta não pode resolver, mas com a graça do Espírito de Jesus Cristo, a Igreja Presbiteriana do Brasil poderá encontrar o melhor consenso possível em torno de uma subscrição integral ponderada e honesta, com espaços para qualificações em pontos que não solapem a pregação fiel da Palavra, a teologia do culto, o sistema de doutrina ensinado nos padrões subordinados e seu sistema de governo.
A solução deste desafio, ou mesmo a busca constante dessa solução e o refinamento paulatino do consenso equilibrado, não resolverão por fiat as tensões que subjazem os debates que ora se manifestam nos termos da chamada ameaça de práticas neopuritanas. As dificuldades causadas à Igreja Presbiteriana do Brasil relativas a essa problemática não poderão, contudo, ser resolvidas sem essa busca honesta e franca. À medida em que a identidade confessional da IPB for preservada e reafirmada mediante um consenso equilibrado de subscrição confessional que seja franco e consistente, tratados disciplinarmente nos termos constitucionais os excessos e as distorções (quer na rigidez excessiva, quer na flacidez), as práticas divisivas serão restringidas e, possivelmente, vão tender a evanescer.
Conclusão
Observando os conflitos atuais sobre a subscrição confessional e as palavras ácidas lançadas por parte dos mais extremistas de ambos os lados (com termos pejorativos tais como “liberais”, “fundamentalistas”, “heterodoxos” ou “obscurantistas”), causa tristeza perceber que tais conflitos não decorrem de preocupação com negação da Trindade, da inspiração e inerrância das Escrituras ou de outras doutrinas essenciais ao pensamento bíblico refletido na confissão Presbiteriana. Eles emanam primariamente do desconforto com posicionamentos práticos na liturgia e na vida da igreja, os quais alguns transformam em pedra de toque da ortodoxia, enquanto outros rejeitam como manifestações de um passado a ser esquecido. Estes aspectos litúrgicos e práticos não são irrelevantes, mas podem ser facilmente superdimensionados.
Na maioria dos debates mais calorosos, as acusações e o fratricídio (delito de homicídio cometido contra o próprio irmão ou irmã) das reputações se dão por causa de coisas que poderiam ser facilmente toleradas se fossem tidas como coisas secundárias. Assuntos concernentes às circunstâncias do culto, outras atividades da igreja local e da vida cristã, tanto por irmãos que são mais literais na observância dos Símbolos de Fé, quanto por aqueles que são mais tradicionais, têm se tornado, equivocadamente, uma suposta marca do verdadeiro presbiterianismo. A atitude sectária e proselitista de uma minoria extremista nas redes sociais, ainda que seja primariamente um fenômeno retórico (ou seja, sem concretude em termos de edificação), tem consequências objetivas danosas para a paz da igreja e sua pureza.
Por outro lado, grupos diversificados e igualmente elitizados se alimentam da resistência às ações de uma minoria extremista como desculpa para amplificar o pluralismo teológico, o qual inclui a fragilização da autoridade das Escrituras em nome, por exemplo, de teorias evolucionistas, a substituição da ética bíblica por ideologias seculares de esquerda e direita, os postulados da alta crítica bíblica em prol da ordenação de mulheres ao sagrado ministério da Palavra e dos sacramentos, a aceitação acrítica de cosmovisões seculares como o darwinismo, teorias críticas de raça, pragmatismo litúrgico (com cultos não mais limitados pela Palavra e sim conforme a vontade humana), bem como a transformação do púlpito mediante acomodação cultural (sob a justificativa de suposta relevância). Da mesma forma que o termo “votos de ordenação” tem sofrido golpes duríssimos por parte dos legalistas, o mote missional que deveria indicar o movimento de “ir ao encontro dos perdidos” tem se perdido numa retórica plural, oca de conteúdo doutrinário e repleto de graça barata que nem chama ao arrependimento e nem aponta para tudo que significa seguir Jesus.
Rejeita-se, assim, a alegação de que irmãos mais alinhados a certas práticas de parte da herança puritana (“neopuritanos”) sejam mais puros ou mais crentes, bem como se rejeita a alegação de que sejam menos dignos aqueles que, atendendo aos padrões de fé e conduta da IPB, não veem a necessidade de adotar complementarmente ideais, posições ou práticas neopuritanas. Entenda-se aqui o termo “neopuritano” (um termo precário, mas já largamente adotado) como referindo-se àquele que manifesta mentalidade extremista que, valendo-se de práticas piedosas (p.ex. salmodia exclusiva), promove a divisão dos irmãos presbiterianos entre os “verdadeiros reformados” e os outros que devem ser convertidos a um tipo de presbiterianismo mais rigoroso, em torno da uniformidade religiosa.
Assim, a todos os irmãos presbiterianos, a Igreja Presbiteriana do Brasil apela para a lembrança de que:
- Somos salvos pelo sacrifício de Cristo em nosso favor e não por causa de nossas obras (práticas), quaisquer que elas sejam;
- O mau uso da língua e o sectarismo entre irmãos são pecados gravíssimos, mas o desenvolvimento de corações largos e receptivos, lastreados sempre na verdade, é o método de amadurecimento da Igreja (Efésios 4);
- O estudo do movimento puritano e da visão teológica de seus principais autores é de relevante utilidade para o crescimento espiritual da Igreja ainda hoje;
- Nossos irmãos puritanos também não eram concordantes nas práticas de piedade, mas se esforçavam por viver vidas piedosas em favor de todos os irmãos;
- Deve haver em nossa vida conciliar uma busca do melhor consenso possível em torno de uma subscrição integral ponderada e honesta, com espaços para qualificações em pontos que não solapem a pregação fiel da Palavra, a teologia do culto, o sistema de doutrina ensinado nos padrões subordinados e seu sistema de governo;
- Um esforço por uma subscrição confessional ponderada, franca e consistente em todos os âmbitos da IPB, especialmente os Presbitérios, é importante para a preservação da paz e da pureza da denominação;
- Os excessos e distorções (quer se tratem de rigidez excessiva, quer da flacidez confessional) devem ser tratados conciliarmente nos termos constitucionais, de forma que a força danosa de práticas divisivas seja restringida;
- Deve preponderar nas relações pastorais e conciliares um espírito gracioso e generoso, de tolerância e condescendência naquilo que não faz parte essencial do consenso possível de subscrição aos Símbolos de Fé da IPB;
- Os Presbitérios devem zelar com sabedoria bíblica para que, reconhecendo incompatibilidade de visões quanto às questões práticas e litúrgicas em seu meio (dentro dos limites da subscrição confessional como exposta nesta Carta), evitem a alienação de irmãos que estejam dispostos ao convívio gracioso, e, ao mesmo tempo, evitem nas designações de campo ou na aprovação de relações pastorais aquelas que possam criar a possibilidade de, ou permitir, situações aonde a concorrência de visões e práticas agravem conflitos e roubem a paz das igrejas e dos concílios;
- Os padrões adotados pela IPB são suficientes para uma vida piedosa e devem ser observados por todos.
Homens santos e pecadores podem discordar ardentemente sobre vários assuntos não essenciais. Isso não significa que não existam extremos de ambos os lados, mas que a boa moderação, aquela que nunca se confunde com a indiferença, aponta o caminho para a defesa de doutrinas que jamais podem ser negociadas e para a boa consciência daqueles que se identificam com a ordem e a disciplina da Igreja Presbiteriana do Brasil.
A lição para os evangélicos é a necessidade de cuidado vigilante com o sagrado equilíbrio da ortodoxia histórica que mantém a Igreja unida na verdade e no amor. A chave para manter isso é o espírito de caridade entre irmãos que comungam com integridade em torno dos “artigos essenciais e necessários” e se respeitam mutuamente em “pontos extra essenciais e não necessários de doutrina”. A unidade cristã é encontrada nas verdades centrais que compartilhamos juntos como seguidores de Cristo. [19]
NOTAS:
[1] Esta Carta Pastoral faz conjunto com dois outros documentos: 1) O Relatório Histórico-Teológico Sobre Práticas chamadas Neopuritanas; e 2) Sumário Executivo do Relatório da Comissão Sobre Práticas Chamadas Neopuritanas. O primeiro documento é um relatório de natureza acadêmica e oferece um aprofundamento dos temas levantados aqui, assim como toda documentação e as referências bibliográficas para substanciar o argumento. O segundo documento resume o primeiro, mas com documentação de referências.
[2] SC — 2010 — DOC. LXXVI: Quanto aos documentos: 027 — Sobre Práticas Neopuritanas; 028 — Proposta quanto a Práticas Neopuritanas; 229 — Consulta quanto Práticas Litúrgicas: O SC/IPB — 2010 RESOLVE: 1. Referendar a decisão da CE-SC/IPB 2008, contida no documento 193: “CE-SC/IPB-2008 — Doc. CXCIII — Quanto ao documento 202 — Proveniente do Presbitério Sul Paulistano Sínodo de Piratininga — Ementa: Consulta do Presbitério Sul Paulistano Sobre Práticas NeoPuritanas. Considerando: 1. Que as práticas elencadas pelo PSPA tais como: cântico exclusivo de salmos, proibição de mulheres cristãs de orarem nos cultos da Igreja, proibição de instrumentos musicais e de corais nos cultos não encontram amparo nos símbolos de fé da Igreja e nem nos Princípios de Liturgia que regem o culto na Igreja Presbiteriana do Brasil; 2. Que a Igreja Presbiteriana do Brasil é historicamente uma Igreja litúrgica, e que tem primado por um culto solene, embasado nas Sagradas Escrituras conforme interpretado pelos seus símbolos de fé; A CE-SC/IPB 2008 RESOLVE: 1. Lamentar que as restrições esposadas por aqueles que defendem tais práticas estejam trazendo confusão no seio do povo presbiteriano; 2. Determinar aos pastores que observem os “Princípios de Liturgia” da Igreja Presbiteriana do Brasil como parâmetro litúrgico para os cultos em suas igrejas, bem como os fundamentos teológicos do culto esposados pela Confissão de Fé de Westminster e seus Catecismos Maior e Breve como norteadores para uma sadia teologia do culto; 3. Determinar aos concílios da Igreja Presbiteriana do Brasil que velem pela execução da liturgia reformada, conforme expressa nos Símbolos de Fé e Princípios de Liturgia adotados pela IPB, repelindo todas as práticas estranhas a eles, quer sejam elas “Neo-Puritanas” de restrição de genuínos atos litúrgicos, quer sejam de acréscimos de práticas antropocêntricas “Neo-pentecostais”“.
[3] Lucas, Sean Michael (2011). O Cristão presbiteriano. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 168.
[4] Para aprofundamento desta questão, ver Fortson III, S. Donald, editor (2007). Colonial Presbyterianism: Old Faith in a New Land. Princeton Theological Monograph Series Book 71. Eugene: Pickwick Publications (Edição Kindle).
[5] Os pais da Assembleia de Westminster também se mostraram divididos quanto a recepção de credos históricos, tal debate não chegou a um denominador comum, pois ironicamente eles se dedicaram a escrever uma nova confissão para unir os reinos da Inglaterra, Escócia e Irlanda numa base comum. Esta pesquisa não nega sob hipótese nenhuma a importância dos credos e das confissões, mas reconhece que a relação entre a tradição e a autoridade suprema das Escrituras Sagradas não é um assunto para ser tratado com extremismo simplista. Nesses termos o resultado do processo de debates coloniais americanos não precisa ser visto como deturpação ou vitória sobre a tirania confessional, antes ele pode ser visto sob a perspectiva do equilíbrio que ajudou a lançar as bases para uma subscrição confessional presbiteriana na América Colonial.
[6] Lucas, Sean Michael (2011). O Cristão presbiteriano. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 170.
[7] Fortson III, S. Donald, editor (2007). Colonial Presbyterianism: Old Faith in a New Land. Princeton Theological Monograph Series Book 71. Eugene: Pickwick Publications (Edição Kindle). posição 168.
[8] “Na atualidade, a diferença mais imediatamente visível entre as igrejas antigas e novas é que os cristãos do Sul são muito mais conservadores, no que se refere a suas crenças e seus ensinamentos morais. As denominações que vem triunfando em todo o Sul do planeta são resolutamente tradicionalistas ou até reacionárias, pelos padrões das nações economicamente avançadas”. (Jenkins, 2014, p. 23)
[9] O reconstrucionismo é uma teoria de ação pública que procura resgatar a lei civil de Israel no A.T. para o contexto jurídico pós-iluminismo e post-bellum americano. Em alguns casos, o reconstrucionismo serviu como uma porta de entrada para uma renovação das percepções Covenanters do passado, especialmente o entendimento escocês de uniformidade religiosa. Atualmente, um pequeno grupo trabalho para recuperar tal percepção como único remédio para uma denominação que, segundo eles, se afastou de suas raízes originais escocesas. Para Alex Castro, em um prefácio ao livro A Bandeira Azul de Robert Pollok Kerr, traduzir e fazer conhecido o passado Covenanter “apresenta-se como um pequeno raio de luz brilhando sobre as trevas dessa ignorância. Contudo, não se trata apenas de trazer mais conhecimento histórico, e sim uma tentativa de fazer o testemunho desses santos, contemplado através da doutrina e piedade deles, influenciar a nossa geração”. (Kerr, 2021, p. 12) Nós, presbíteros desta denominação louvamos a Deus pela história dos Covenanters e por sua coragem na luta contra a imposição da falsa religião feita por autoridades ímpias. Sem eles, o presbiterianismo não teria se espalhado pelo mundo. Contudo, o tempo e o desenvolvimento doutrinário dentro do consenso denominacional que temos desde 1888 não contempla a uniformidade religiosa em um contexto de Igreja nacional. Essas mesmas convicções se encontram no corpo basilar das práticas da Igreja Puritana Reformada fundada por Elmir de Oliveira Júnior.
[10] SC — 2010 — DOC. LXXVI: Quanto aos documentos: 027 — Sobre Práticas Neopuritanas; 028 — Proposta quanto a Práticas Neopuritanas; 229 — Consulta quanto Práticas Litúrgicas: O SC/IPB — 2010 RESOLVE: 1. Referendar a decisão da CE-SC/IPB 2008, contida no documento 193: “CE-SC/IPB-2008 — Doc. CXCIII — Quanto ao documento 202 — Proveniente do Presbitério Sul Paulistano — Sínodo de Piratininga — Ementa: Consulta do Presbitério Sul Paulistano Sobre Práticas NeoPuritanas. Considerando: 1. Que as práticas elencadas pelo PSPA tais como: cântico exclusivo de salmos, proibição de mulheres cristãs de orarem nos cultos da Igreja, proibição de instrumentos musicais e de corais nos cultos não encontram amparo nos símbolos de fé da Igreja e nem nos Princípios de Liturgia que regem o culto na Igreja Presbiteriana do Brasil; 2. Que a Igreja Presbiteriana do Brasil é historicamente uma Igreja litúrgica, e que tem primado por um culto solene, embasado nas Sagradas Escrituras conforme interpretado pelos seus símbolos de fé; A CE-SC/IPB 2008 RESOLVE: 1. Lamentar que as restrições esposadas por aqueles que defendem tais práticas estejam trazendo confusão no seio do povo presbiteriano; 2. Determinar aos pastores que observem os “Princípios de Liturgia” da Igreja Presbiteriana do Brasil como parâmetro litúrgico para os cultos em suas igrejas, bem como os fundamentos teológicos do culto esposados pela Confissão de Fé de Westminster e seus Catecismos Maior e Breve como norteadores para uma sadia teologia do culto; 3. Determinar aos concílios da Igreja Presbiteriana do Brasil que velem pela execução da liturgia reformada, conforme expressa nos Símbolos de Fé e Princípios de Liturgia adotados pela IPB, repelindo todas as práticas estranhas a eles, quer sejam elas ‘Neo-Puritanas’ de restrição de genuínos atos litúrgicos, quer sejam de acréscimos de práticas antropocêntricas ‘Neo-pentecostais’.
[11] Ribeiro, B. (1987). A Igrejas Presbiteriana no Brasil, da autonomia ao Cisma. São Paulo: Semeador.
[12] Ribeiro, B. (1991). Igreja Evangélica e República Brasileira (1889–1930). São Paulo: O Semeador. P. 291.
[13] Arnold, Frank L. (2012). Uma longa jornada missionária: A história das missões presbiteriana norte americanas no Brasil. São Paulo: Cultura Cristã. p. 37.
[14] Hahn, Carl Joseph (2011). História do Culto Protestante no Brasil. São Paulo: ASTE. pp. 135 e 122.
[15] Ribeiro, B. (1987). A Igrejas Presbiteriana no Brasil, da autonomia ao Cisma. São Paulo: Semeador. p. 224–225
[16] Matos, A. S. (2009). Uma Igreja peregrina: história da Igreja Presbiteriana do Brasil de 1959 a 2009. São Paulo: Cultura Cristã. p. 313.
[17] Reily, D. A. (2003). História Documental do Protestantismo Brasileiro. São Paulo: ASTE. p. 238.
[18] Simões, Ulisses Horta (2002). Subscrição confessional — Necessidade, relevância e extensão. Belo Horizonte. p. 169.
[19] Fortson III, S. Donald (2008). The Presbyterian Creed: A confessional Tradition in America, 1729–1870. Paternoster. posição 6929.